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A intervenção no Estado, o MST e o governo Ana Júlia

Hoje ainda estamos impactados pela decisão do TJE em relação à possibilidade de intervenção no Estado no Pará. Concordo que esta medida tem forte impacto sobre a imagem do Pará.

Na assembléia legislativa tomamos conhecimento que dois tipos de CPI estão sendo pensadas. Uma proposta pelo deputado Bordalo do PT, que quer uma CPI para averiguar a grilagem de terras no campo e para apurar a emissão de quase 6.000 títulos de terras ilegais. Na contramão, o deputado José Megale do PSDB, quer uma CPI para investigar os conflitos recentes e as possíveis ligações do governo com os movimentos que estariam invadindo propriedades no campo.

Pelo tipo de proposição das duas CPI’s, fica muito clara a leitura distintas que os deputados fazem em relação aos conflitos de terra no Pará. Para o deputado Bordalo, os conflitos não vão acabar, mesmo que o governo execute todas as reintegrações de posse demandadas pelo TJE. Para ele, a raiz do problema esta na titulação da terra e na sua regularização fundiária.

O PSDB quer investigar os conflitos recentes (claro, ele não gostaria de lembrar de Eldorado dos Carajás) e as ligações do governo com os movimentos sociais, que dentro de sua leitura são os responsáveis pela quebra da ordem e da harmonia. Para ele, o atual governo não só dialoga com os movimentos sociais, mas e seu parceiro, é incentivador das invasões de terras no Pará, o deputado não questiona os títulos de posse dos grandes proprietários no Pará. Também não quer investigar a procedência destes títulos.
Há uma convergência do pensamento do deputado Megale com a fala do Carlos Xavier, presidente da Federação dos Agricultores do Estado do Pará (FAEPA), quando ele diz: não queremos "tirar a governadora do cargo, o que queremos e buscar parceiros para afastar de nosso Estado quem esta destruindo o que está pronto. A idéia da intervenção, e que venham pessoas de fora para nos ajudar a mandar embora estes vândalos”. O presidente da FAEPA deixa muito claro que não vê mais no governo a parceria que ele almeja e reafirma a noção de que todos que vem de fora prejudicam o Pará, são vândalos.

Nada mais conservador retrógrado e preconceituoso. Podemos alencar junto com o PSDB e Carlos Xavier, a fala da vereadora Tereza Coimbra (PDT) e de outros vereadores (Pio Netto/Raimundo Castro -PTB e Fernando Dourado -DEM) que dizem que isto foi um aviso à governadora Ana Júlia, para que ela cumpra os mandatos de reintegração de posse. O vereador Paulo Queiroz (PSDB) acusa o MST de possuírem entre seus integrantes bandidos e criminosos

Outro argumento levantado é o do deputado Parsifal Pontes (PMDB) que alega fissuras nas relações entre os poderes, causadas principalmente pela queda no repasse de recursos, o que o governo estadual alega ter acontecido em virtude da crise internacional e pela queda na arrecadação. Para o deputado há inapetência do governo na relação com poderes na decisão.

Cláudio Puty, Chefe da Casa Civil, declarou à imprensa, que o governo do Estado já cumpriu 101 mandatos e outras ações estão sendo cumpridos pelos comandos regionais da PM, o que dá um total 200. O governo anterior deixou de cumprir 186 mandatos de reintegração de posse rural e urbana, para o secretário, problema de fundo e regularizar a posse da Terra.

Podemos perceber que se conformou (pelo menos entre os políticos) dois grandes blocos, com um possível terceiro bloco ao centro. No bloco ligado ao PT e ao governo, o entendimento é que o problema não vai ser resolvido por reintegrações de posse, mas sim pela regularização fundiária das terra. Este bloco não criminaliza os movimentos sociais e as pessoas pertencentes a eles, e não trabalha com a noção de quem vem de fora é necessariamente criminoso e vândalo.

O bloco formado pelos políticos do PSDB, que deram declaração na imprensa e pelos vereadores do PTB e do PDT citados, iludem-se achando que o problema está no governo que não fez todas as reintegrações de posses solicitadas. Pensam que as reintegrações resolvem o problema, ledo engano, se o problema fundiário no Pará não for resolvido, teremos novas “invasões” e novos pedidos de reintegrações de posse. O cerne do problema é que hoje se questiona a legalidade dos títulos de posse da terra no Pará.
Outra questão não respondida, é por que o TJE, não tomou a mesma posição em outros governos ? O porquê da tomada de posição neste governo? A própria fala noticiada e divulgada no diário do Pará do Dia 12 de novembro de 2009, da desembargadora Albanira Bermeguy, nos da indicios :“Esta violência no campo já existe há 30 anos” , a desembargadora indica que o TJE vê uma diferença deste governo em relação aos outros governos. Agora no governo do Pará, identifica-se uma postura diferenciada em relação aos movimentos sociais e está postura incomoda aqueles que preferem a leitura fácil, a de identificar os criminosos e os malfeitores dos lado dos movimentos sociais e identificar os grandes proprietários de terra e do agro negócio como homens bons e que tem suas propriedade invadidos por “vândalos”.

A questão da posse da terra na Amazônia, influência as taxas de desmatamento, a expansão da pecuária extensiva, os investimentos de mão de obra e capital, a imigração da população, a ação de movimentos sociais e nos programas governamentais. Além do Desmatamento e a exploração da madeira.

Rever a política de posse da terra no Pará é urgente para implantação de um novo modelo de desenvolvimento na Amazônia. Os grandes proprietários de terras mantêm a Amazônia como um latifúndio.

O biólogo Philip Martin Fearnside, escreveu um texto no encarte de O Liberal do dia 04 de novembro, que cita dados muito importantes para o entendimento da questão fundiária na Amazônia. Ele afirma que dos quatro milhões de km2 da Amazônia Brasileira, que eram originalmente florestados, já foram desmatados 738 km2(dados do INPE) ou 18,5 % da floresta original. Cerca de 80 % destas áreas estão hoje sobre pastagens ou florestas secundárias, em pastagens que foram degredadas e abandonadas. Segundo ele, muitas das áreas de pastagens, estão nas mãos dos grandes proprietários de terra. A redistribuição de pastagens das grandes fazendas à população de Sem terras da região, para conversão destas áreas para a agricultura familiar seria um avanço significativo para a reforma agrária.

A imigração constante para a Amazônia, como a última fronteira de terras disponíveis inviabiliza, cada vez mais esforços de manter a floresta em pé. Para Fearnside, antes de 1970, grandes partes da terra públicas foram concedidas para colheita de produtos naturais como a borracha e a castanha do Pará.estas concessão foram dadas as oligarquias paraenses, que as usaram para o desmatamento e para criação de pastagens, burlando assim as concessão. Hoje os movimentos sociais questionam essas concessões e não consideram estes latifundiários proprietários da terra. Nove das grandes fazendas (cada uma com aproximadamente 1000 hectares) de Marabá são da família Mutran ganhadora de uma concessão por 99 anos.

As terras também foram conseguidas por grileiros com documentos falsos. Uma parte considerável das terras no Pará é registrada em nome de fantasmas. Ainda hoje não temos no Brasil um cadastro nacional de terras, a maioria das terras não tem informações georreferenciadas sobre os limites das propriedades. Em 2000 o MDA cancelou as inscrições de 1899 grandes propriedades, no Pará foram cancelados 344 registrados, ou 88% dos latifúndios do Estado.

Propriedade com registros cancelados não tem título válido. Em 2009, a chamada MP da grilagem (medida provisória nº. 468, que se tornou lei nº. 11952) abriu caminho para legalizar áreas ilegais de até 1500 hectares. O governo federal pretende legalizar 66 milhões de hectares, ou seja, metade do Pará através dos INCRAS na Amazônia. A lei cria expectativa que futuras legalizações poderão ocorrer.

No nosso entendimento, temos que reagir a qualquer tentativa de intervenção no Pará, mas a melhor reação é o aprimoramento de políticas que resolvam a questão. Estamos em um momento muito importante de aprovação do orçamento do Estado. Mais eficaz que qualquer CPI é discutir as verbas destinadas ao ITERPA para que ele possa implementar mais ágil, com mais aportes financeiros, uma política de regularização fundiária principalmente no sul do Pará e nas áreas de conflito eminente.

A população tem que saber que grande parte dos títulos de terra do Estado foram suspensos, que grande parte das concessões feitas pelo governo, para concessão da castanha e da borracha foram utilizadas para exploração da madeira e para pastos, e ainda que parte dos títulos de terras foram conseguidos pela grilagem.
Portanto muitos fazendeiros que hoje reclamam de “seus direitos”, não tem tantos direitos. Regularizar a posse é fundamental para término dos conflitos agrários no Pará.

Melhorar a propaganda do governo, articular fórum regionais de debates das políticas de regularização fundiária no Estado são fundamentais para o fim da violência no campo.

Quais são os recursos disponíveis para solução de conflitos no sul e sudeste do Pará? Quais os aportes necessários de recursos humanos para o ITERPA? Quais os resultados do convênio do MDA com o governo do Estado por meio programa Terra Legal? Este é o debate de fundo que devemos publicizar, para o conhecimento e envolvimento de todos.

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